BUCK ANGEL (EUA)

Um homem otimista

Mesmo antes do início dos trabalhos da 1ª Conferência Internacional [SSEX BBOX] & Mix Brasil, logo na manhã do primeiro dia de debates, a reportagem já tratou de conseguir uma fala do “homem com vagina”, como ele mesmo se define, mais famoso do mundo. Buck Angel – homem transexual, produtor de filmes adultos, performer e ícone LGBTQIA – é militante, palestrante, escritor e tem a receptividade como seu maior cartão de visitas. Leia trechos da entrevista:

Qual a sua primeira impressão do Brasil?

Incrível! Porque eu cheguei no aeroporto e logo vi um café!!!! [risos]. Sou viciado em café. Mas gosto de café de verdade e o brasileiro é maravilhoso. Eu amei. Então diria que essa foi minha primeira impressão [risos]. Minha segunda foi ver pessoas realmente incríveis, lindas e amigáveis. Muito amigáveis, fáceis de você abordar e conversar. Eu viajo muito e posso dizer que não é assim em todos os países.

Mesmo? Tem-se questionado muito por aqui se somos de fato amigáveis.

Por quê?

Há tanta coisa acontecendo…

Mas no mundo inteiro… Não sei, eu senti esse clima amigável aqui. Talvez porque eu seja uma pessoa amigável. Eu acredito em energia. Então, se eu chegar para você e perguntar onde é o banheiro de uma forma brusca, dura, é totalmente diferente de chegar e perguntar a mesma coisa só que com um sorriso no rosto, dando um “oi” antes. De qualquer forma, todos têm sido tremendamente doces e gentis. E outra coisa: a comida… Eu amo peixe, por exemplo, e o peixe aqui é incrível. Enfim, eu amo comida, café e pessoas, e vocês têm tudo isso [risos].

Sobre a conferência, qual você diria que é a importância de realizá-la num país como o Brasil – que, entre outros problemas ligados a essa temática, tem níveis assustadores de morte de pessoas transexuais?

É justamente por isso! Há cinco ou seis meses eu mesmo não sabia do número de mortes de pessoas LGBTQIA aqui. E fiquei chocado! Boa parte do mundo não entende isso. Então, é claro que temos que fazer essa conferência no Brasil. É uma questão de direitos humanos, e não apenas de direitos dos brasileiros, as pessoas viverem suas vidas do modo como elas quiserem. Desde que você não mate ninguém, é seu direito ser gay, ser hétero, ser negro, ser branco, ser quem você é e quem você quiser ser. Então, o fato de haver pessoas por aí que estão nos assassinando é muito grave. Como ativista, eu tenho a voz para vir a lugares como o Brasil, onde minha “voz branca” é tão poderosa. Eu sou privilegiado por ser um homem branco hoje – eu era uma mulher gay branca.

E você pensa sobre esse viés racial nas suas ações?

Todo o tempo. Porque eu sei que ter me tornado um homem branco me deu poder. Muitos dos meus amigos são negros, minha vida inteira eu convivi com pessoas negras, por isso acho tão importante ser capaz de usar minha voz privilegiada numa arena como essa. É muito interessante observar como as pessoas me ouvem mais, por seu ser um homem trans branco, do que ouviriam um homem trans negro ou um gay negro. É muito triste, mas é a realidade. E a gente precisa tirar vantagem da realidade que temos. Eu me sinto muito honrado, e com sorte, por ser essa pessoa que pode promover mudanças no mundo. Você sabe o quão poderoso é isso? Sempre me emociono quando digo isso, porque eu não era assim. Eu era uma pessoa que me cortava, que já quis me matar, tinha uma vida horrível. E agora cá estou eu, no Brasil, entre essas pessoas lindas e amáveis.

E interessadas em ouvir o que você tem a dizer.

Exato. Isso é muita coisa. Você e eu juntos podermos provocar mudanças.

E o que você espera que vai acontecer por aqui ao longo desses seis dias?

Estou com muita expectativa. Mas de um jeito bom e realista. Muitas pessoas passarão por aqui e muita coisa vai mudar. Há muitas diferenças entre as tantas vozes da comunidade – aqui e no mundo todo –, mas isso é assim com todas as comunidades. Mas estamos aqui por único motivo: mudança. Todos estão cansados do modo como as coisas estão. Aqui, no Brasil, vocês estão cansados de sentir medo de andar na rua – gay, trans etc. – e serem mortos ou mesmo xingados de bicha, sapatão, o que seja. Chega! Estamos em 2015. Essa merda não pode continuar acontecendo.

Você é um otimista?

Dos grandes [risos]. 100%. Sou o cara que sempre olha as coisas de uma maneira positiva, porque eu acredito que se você expressa positividade será isso que você vai receber em troca. O copo está meio cheio. E funciona para mim. Ser uma pessoa positiva faz parte de uma atitude de mudança.

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